sexta-feira, 31 de julho de 2009

Liberdade

Antigamente as cidades do interior de Minas, pobre como eram, algumas continuam sendo, recebiam pessoas de várias cidades ao seu redor em busca de serviços que não e encontravam nas suas cidades de origem. As pessoas viam procurando médicos, advogados, dentistas e todo tipo de serviços que tinham necessidade. Uma das importações entre municípios mais comuns era de prisioneiros. Freqüentemente isso acontecia. Via de regra somente havia uma cadeia pública que atendesse a região. As cadeias não eram tão cheias e raramente se ouvia falar de um crime bárbaro. Geralmente eram assaltos. Antes, até os crimes cometidos eram menores. Caso conseguisse conversar com o preso, sairia de lá convencido que ele, ou era vítima do sistema, ou foi confundido com outra pessoa e, que nunca roubara nada de ninguém. Eram sempre santos. O sentimento de dó nesses casos era certo. Num desses anos dos anos 50 chegara a Alvinópolis Tité. Veio para cumprir pena na cadeia publica da cidade. Já com idade avançada pra época, davam-lhe quarenta e cinco anos, mas nunca se soube sua idade certa, começou a cumprir sua pena. Alvinópolis é pequena ainda hoje, podem imaginar a sessenta anos atrás. Todos se cumprimentavam nas ruas. O leiteiro entrava porta adentro para entregar a encomenda. Quitutes eram trocados aos montes entre os vizinhos. Quando Dona Maricota fazia uma quitanda levava um bocadinho para Dona Maria das Mercês. Que em contrapartida lhe dava laranjas pegas fresquinhas no pé, lá da fazenda. E assim a vida caminhava a passos de carroças. Podem imaginar o que acontecia com as pessoas que vinham de fora? Todos queriam saber de onde viera, o que fizera da vida. Qual era seu propósito ali e o mais importante, era filho de quem. Quando chegava um preso as perguntas se diminuíam. Ater-se-ia somente ao ocorrido. Tité chegara pra cumprir pena de uns 10 a 12 anos. Já se demonstrou muito pacífico nos primeiros meses, e assim ganhara a confiança dos guardas da cadeia. Pouco a pouco além da confiança ganhara a liberdade de trabalhar para o estado. Os guardas o mandavam para a rua para realizar os seus serviços menores. Ele ia sempre ao açougue pegar a carne para o almoço dos outros colegas, ia à mercearia levar o quilo para a cadeia, e assim cuidava da sua cadeia e dos seus presos diariamente. Os anos foram passando. A cidade crescendo e ele começara a freqüentar as cozinhas das casas das Donas Maricotas e Mercês. Além do quilo e da carne levava agora, em dias de festa, quitandas para a cadeia. Diz-se que Tité não perdia a comunhão da missa das seis na matriz todos os domingos. Ajudava inclusive a carregar as sacolas mais pesadas das senhoras que voltavam da feira. Certa feita foi a uma fazenda da região a convite de um dos coronéis que lá mandava para realizar serviço de roça no pasto. Começara ai a usurpação do estado pela esfera privada. Claro que o moço não era pago e não tinha um dia sequer da sua pena reduzida. Mas assim mesmo continuava a viver na sua vida de preso da cidade. Certa feita, passados alguns anos chega a comunicação do Juiz da comarca que seu débito com a sociedade estava quitado. Pago. Já não havia mais nada que nos devesse. Antevendo como seria dar a noticia para o detento, os guardas da cadeia fizeram uma disputa de purrinha pra ver quem seria o afortunado a dar a notícia ao futuro libertado. Essa disputa se prolongou por semanas. Até que veio a ordem expressa do Juiz: - Soltem o pobre coitado! Resolveram formar uma comissão dos guardas para que fosse dada a notícia para o, a essa altura, ex-detento. Tité era um negro forte e bem formado. Braços largos e longos de longa lida. Espaldar de jogador de qualquer coisa que usasse a força. Então era prudente que se precavessem de algo pior. E o pior aconteceu. Imediatamente quando deram a notícia para o libertado, ele pegou um dos três guardas pelo pescoço e deu-lhe uns bons safanões. A fúria e raiva que nunca haviam visto aparecera naquele moço pacato. Aos berros gritava que ninguém o tiraria da cadeia. Que Juiz nenhum mandava na vida dele. E que a pena que ele tinha que cumprir era maior. Que tava todo mundo errado. E se ele estivesse errado ele tiraria aquela vida que tinha nas mãos para que tivesse mais pena a cumprir. Como no Brasil não havia pena de morte, certamente pegaria uma perpétua para a sua idade. Ficaria ali até morrer. Foram chamadas várias guarnições policiais, pentecostais e de senhoras das cozinhas. Sem precisar matar ninguém, e com a promessa do Padre, com a benção do Juiz e com os cuidados das senhoras das cozinhas, ele ganhara sua liberdade. Sua liberdade foi escolher. Ganhou a vida de preso.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Descobri quem mexeu no meu queijo!

Ainda não meus caros. Ainda não me rendi aos livros de auto-ajuda de qualquer tema. Muito rasos para a profundidade da alma e do essencial do humano para ser tratado como receita de bolo. Se for pra ler receitas, que sejam culinárias. Pelo menos o sabor e os resultados são mais garantidos. Mas voltando ao queijo. Quando morava na minha Campo Grande, ou Big Field, carinhosamente pelos que a amam, fiz uma dessas minhas viagens pelo Brasil, não sei pra onde e nem sei se foi a trabalho ou a lazer, mas sei que quando voltei tinham mexido no meu queijo, literalmente.
Quando saí de BH fiquei mais mineiro. Torci mais pro Galo, se é que isso é possível, as músicas do Clube da Esquina faziam mais sentido que nunca, os poemas de Drummond colocavam palavras nos meus sentimentos e sentidos. Até Roberto Drummond comecei a respeitar! A saudade e da nossa terra idealizada nos faz vê-la como a queremos. Uma das coisas que mais sentia falta era da culinária daqui de casa. Daqui de minas. Quando a saudade apertava demais, ia a um restaurante de comida mineira por lá. Na parede ao fundo do fogão a lenha havia uma foto famosa de um meu conhecido do pôr do sol de BH. Era a vista da serra do curral. Quando via essa imagem meu peito se enchia de lágrimas. Mas logo era calado pelo sabor do frango com quiabo que me lembrava a cozinha da minha avó. Numa dessas vindas a BH para matar a saudade do ar das montanhas levei um pedacinho delas comigo na bagagem. Sim, levei um pedacinho das montanhas de minas comigo. O legítimo queijo canastra. Oriundo de lá mesmo da linda serra da canastra. Dessa maneira, me sentia bem pertinho das minhas montanhas todas as manhãs, juntamente com o café fresco. E assim foi. Pedacinho por pedacinho, religiosamente todas as manhãs. Um pedacinho daquela iguaria pra alma por dia. Bom, viajei, deixei a chave de casa com uma querida amiga, a Fabi, e ela foi lá em casa cuidar das minhas plantas. E ver se estava tudo em ordem. Como toda mulher ordeira e mandona que é, foi dar uma dura na geladeira. Viu um pedaço de queijo que parecia velho, mofado e para checar sua dúvida, meteu o nariz no pote. O cheiro do queijo já bem curado não combinou com o seu sensível e delicado nariz. Ela não teve dúvidas. Lixo! Quando retornei da viagem ela me conta, que além de molhar as minhas plantas, arrumou melhor a casa. Por que a minha faxineira precisava aprender algumas coisas sobre arrumação e limpeza. Agradeci pela gentileza. Afinal, é uma amiga cuidadosa com os dela. E era bem possível que ela cuidasse assim das coisas dos que ela ama e considera no hall dos amigos. Fiquei bem feliz em pertencer. Na manhã seguinte, fui à geladeira, seco de vontade pelo meu canastra e para minha surpresa ele não estava mais lá. Foi um choque. Era como se tivessem calado Milton Nascimento no meio do seu mais alto falsete. Fiquei mudo. Sem reação. Sem entender o que acontecera. Meu canastra acabou? Bom, se a Fabi tivesse se rendido a ele, tudo bem. Quem não se renderia? Com muito jeito e meio sem graça resolvi perguntar se ela havia gostado do queijo. E ela me disse: - Eu? Joguei aquilo fora! Estava fedendo a geladeira. Ah! Entendi naquele momento a dor de Otello. Traído pela própria amiga. A quem confiara a chave da própria morada. Traído. Meus olhos se encheram de ira e de lágrimas. Sequei as lágrimas e molhei a garganta seca. E claro que depois desse momento a brincadeira com a Fabi por ela ter mexido no meu queijo ganhou as ruas e nossa roda de amigos. Ela ainda fica sem graça quando a história é contada. Experimentem. Vocês vão morrer de rir com a cara de sem graça dela por ter jogado o meu canastra fora. Ela não sabia, e não saberá tão cedo, quão boa é essa guloseima. Pois canastra mesmo, só mesmo aos pés da Dona Beja.

sábado, 25 de julho de 2009

As ruas da madrugada

A mim, as ruas da madrugada me parecem prostitutas sem sentido.
Sempre esperando aquilo que a trazem o porquê de existirem.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Meia Banda

Chovia no sertão de Goiás. Ainda era tarde. E precisava chegar à capital federal ainda naquela noite. Como os dias eram dias duros e secos, fui tentado a pagar uma viagem clandestina, conseqüentemente mais barata. Além de mim e do motorista, que me parecia ter bastante experiência, um jagunço daqueles fortes, altos e brabos de fazenda grande e duas moças bastante distintas. O coche não era dos piores e lá fomos nós nos embreando no sertão central do Brasil. Afinal, parecia que a viagem iria ser das divertidas. Poderia até fazer amizades com os estranhos que me acompanhavam, quem sabe? Trocar idéias. Ter visões diferentes dos meus pontos de vista já tão arraigados. Queria até mesmo ser convencidos do contrário sobre alguns pensamentos já velhos e desgastados. E a viagem começou. Já se fazia tarde para a noite. As luzes da cidade começavam a ascender, assim como as estrelas que uma a uma iam furando as nuvens esparsas do céu. A chuva cedia. Perdia força à medida que o acanhamento daquelas cinco pessoas desconhecidas iam-se diminuindo naquele espaço minúsculo que a circunstância teimou em nos colocar. Como ganhei o banco da frente com a anuência do motorista ao troco de alguns trocados a mais no preço da passagem, me senti no direito, herdado, de dar o tom nos assuntos dentro do automóvel. Pensei cá com os meus botões. Como colocar o assunto para um peão de fazenda, duas mocinhas delicadas, além de mim, claro. O motorista não precisava se perder nos assuntos da viagem para não se distrair com a estrada. Seria melhor assim. Pensei num assunto em comum. Futebol, elas poderiam não entender. Política, desperta mais paixões e raivas sem sentido que o jogo dos vinte e dois. Música? Sim música, afinal é um assunto que domino. E estávamos em Goiás, terra da música regionalista caipira. Além de tudo poderia até encantar as mocinhas dizendo a elas que toco um vasto repertório que possuo numa pasta de cifras. Estava decidido, seria música. Quando respirei para colocar a primeira frase que foi pensada com cuidado e delicadeza para não agredir os gostos e ouvidos de ninguém, o motorista solta essa: - e o Vila ontem hein? Vocês viram? As meninas imediatamente se entreolharam e disseram em uníssono: - Jogaço! Três a zero foi pouco naqueles gnomos verdinhos do Goiás! E começaram os três a comentarem os detalhes do jogo, como os cartões aplicados, as faltas não dadas e o pênalti que não existiu a favor do Goiás. Mas que mesmo assim o juiz marcou com firmeza. Como o futebol é um esporte quase santo, um milagre foi operado. O goleiro não se mexeu na hora do chute e a bola foi parar nas mãos dele. Justiça! Uma delas exclamou com o orgulho no peito. “Pênalti roubado não entra”. E assim o assunto se desenrolou entre os três como se ninguém mais houvesse no carro. Percebendo o meu silêncio e do calado jagunço o motorista pergunta: - o amigo aí atrás não torce pro Goiás, certo? Ele responde seco: - Não. Um hiato se faz no carro, só se ouve o barulho alto do motor e os pneus no asfalto. Todos esperávamos o complemento do comentário da negativa em torcer pelo time que havia perdido a peleja na noite anterior. Antes do motorista complementar um comentário ele responde desviando o olhar da janela que fitava: eu pesco. Só isso. E não falo de futebol pra não arrumar briga. E briga com aquele homem era coisa que poucos iriam querer. Para não perder a educação o motorista comenta: - então todos somos torcedores do Vila, certo? E me fita com o olhar aguardando aprovação. Eu como bom diplomata que sou me peguei pensando em responder que sim. Afinal de contas, quando viria aquelas pessoas novamente? Seria melhor responder que sim para não causar desconforto. Mas o sangue alvinegro falou mais alto. Respondi quase como o jagunço. Não! Mas a invés do hiato, já tratei de me explicar rapidinho. Sou atleticano. Sou mineiro e torço pro Galo. Alívio para mim e indiferença dos outros quatro. Depois disso, mais um hiato. Pensei em puxar assunto de pescaria com o tal amigo do banco de trás. Mas meus conhecimentos se baseavam em dar banho em minhocas nas barragens que ia quando criança com meu pai. Achei que iria fazer papel de bobo, mas tomei coragem e o fôlego juntos. Afinal poderia, com aquele assunto, trazer aquele pobre coitado para o meu lado da viagem. Já que fui traído pelo motorista quando tirou da minha boca a oportunidade de demonstrar meus conhecimentos de música, elaborei uma pergunta em que a resposta eu conheceria. Não perguntaria de tipos de peixes, iscas anzóis, enfim nada que fugisse ao meu parco domínio dos assuntos de pesca. Preparei-me para a inquisição, e no mesmo momento o motorista solta outra: e como anda a pesca de peraputanga no alto Araguaia? O jagunço se arruma no banco traseiro do carro, se preparando para tecer um longo comentário ao assunto que ninguém ali dominava como ele. E responde seco, - Já foi melhor. Um pequeno hiato e depois disso. “– tem muita poluição nesses dias. O rio ta morrendo”. Um triste silêncio invade o carro. Parecia que estavam velando um moribundo. Talvez as lembranças dos “verões” no Araguaia tenham vindo à memória de todos. Foi nesse momento que me senti um estrangeiro no meio daqueles outros.
O silêncio começou a me incomodar. Queria um som que fosse diferente do ronco do motor e dos pneus no asfalto embalados pelos longos suspiros de saudade de um tempo que ficara na memória deles. Pensei em conversar com as meninas. Teria que ser com as duas ao mesmo tempo para que não pensassem que estava escolhendo uma a outra. Afinal, nós homens é que somos os escolhidos. E deixaria isso por conta delas. Elas que resolvessem quem teria a felicidade de me conhecer. Quem teria o prazer da minha cara companhia. Elas me pareciam serem estudantes. Iria perguntar alguma coisa assim nesse sentido. Mas me prometi que não demoraria, senão o motorista atropelaria novamente as minhas frases e intenções. Sem muito pensar ou respirar perguntei a elas: e vocês duas estudam? O motorista imediatamente mandou-me calar. Pensei, cá comigo. Mas será que fui tão ofensivo em perguntar se as meninas estudam? Tudo bem, a educação nesse país é mesmo uma vergonha, mas não precisava me mandar calar. De repente o barulho seco invadia o automóvel. Era isso. Ele queria ouvir. O barulho do solavanco do pneu batendo no asfalto. O inconfundível barulho de pneu furado. Um misto de alívio, pela repreensão não ter sido pela minha pergunta, e receio, por um pneu furado no meio do nada no sertão central do país. Encostamos-nos à lateral da rodovia. Já se fazia longa a noite. Estrelas furavam o tapete azul marinho do escuro céu. Ouvia-se até o barulho delas a dançar naquela noite. Tamanho o som do silêncio da noite deserta. Descemos do carro e não tivemos dúvida. Pneu furado. O motorista nos aguardou a tirar as poucas bagagens do porta-malas e ficamos ali imóveis, impassíveis, aguardando o motorista a trocar o pneu. Achamos todos que o jagunço, sendo forte e acostumado a trabalhos braçais, iria se prontificar a ajudar. Mas olhando mais de perto, nem forte, e nem muito alto o era. Estava mais para gordo do que para forte. A altura era dada por um tamanco de homem manco, que alinhava a altura de uma perna mais curta que a outra. Nem jagunço o cabra era. As meninas me olharam, com a minha roupa de homem de escritório e logo me julgaram a almofadinha. Que não iria colocar a mão na massa para não me sujar. De certo, pensaram de mim um janota qualquer. Na mesma moeda, percebi que não eram tão distintas assim as mocinhas. Trabalhavam à noite, ajudando os menos afortunados no amor a receberem seus mimos por um valor a mais na passagem. Estavam indo pegar um ônibus para a alta temporada de uma obra federal no Tocantins. Canteiro de obra era certeza de faturamento alto para elas, vendedores de pingas, bíblias e outros devaneios. Resolvi tomar conta da situação. Arregacei as minhas mangas de camisa fina como pensavam, e fui ajudar o pobre motorista. Somente ali percebi que os óculos que ele usava eram mais grossos do que supus no primeiro encontro. Era considerado um quase cego. Ele dizia que as vistas só eram ruins pra perto. Pra longe tava muito bem. Quando vi o estado daquele pneu disparei sem pensar e nem respirar: - mas esse pneu tá completamente careca! E ele respondeu na medida. - Que isso? O pneu tá meia banda. Ainda roda muito. Até rodava, mas não comigo dentro daquele carro meia banda. Sem darmos um pio uns com os outros chegamos ao destino depois de deixar as moças no entroncamento para o Tocantins e o pescador metido a jagunço próximo a um sítio. Prometi a mim que nunca seria assim, meio jagunço, meio pescador. Meio moça-da-vida e meio donzela, meio cego e meio são. Meia banda nunca.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Alegoria dos encontros

A coisa do escrever, do criar, do pensar o nosso tempo e esse mundo vem de fontes das mais diversas. Desde uma brincadeira com amigos, chegando até leitura desenfreada de autores do mais alto gabarito filosófico. A diferença está em estar atento ao mundo e perceber os sinais, alguns claros outros nem tanto, que nos cercam. Foi num desses encontros regados a cerveja torresmo e tira-gostos mineiros que eu e um amigo discorríamos sobre a vida alheia de um terceiro amigo, claro. Botecos e cervejas combinam tanto quanto a mal falada filosofia de bar e a vida alheia comentada. Esse amigo me disse das impressões que tinha tido da atual namorada do dito-cujo. Para ele a mocinha não tinha nada a ver com o amigo foco da conversa. Que ela em nada se parecia com ele. E isso em tom indignado! Na mesma moeda eu respondi:- que bom! Vai ver esse nosso amigo encontrou na amada o que sempre lhe faltara. Se assim o é fisicamente, por que não psicologicamente?
Os encontros são sempre fortunas e nem sempre fortuitos. Sempre há tempo de acontecerem, basta que seu canal esteja sintonizado na freqüência certa. Existem formas mais diretas e outras nem tantos dos encontros se darem. Hoje, temos a internet, os clubes de solteiros, para que deixemos de sê-los. Vamos às boates a fim de encontrar alguém para passar algumas horas e talvez, quem sabe talvez nos vermos em um ou mais dias. Existem até cidades que promovem, pela sua concepção urbanística, a arte do encontro. Outras do desencontro. Mas o que importa é que cada vez mais as pessoas buscam meios para intermediar o que antes era feito deixado completamente para a obra do acaso. Não que as intenções mudaram nesses tempos. As vontades são as mesmas. As necessidades de conquista também. O cerne da questão continua o mesmo. As pessoas continuam com a necessidade de se relacionarem. Mesmo que as relações pessoais sejam cada dia menos impessoais, sempre buscamos forma de compensar esse distanciamento que nos provocamos. E quando nos encontramos, é uma festa. O tempo para. Faz-se silêncio onde havia barulho. E tudo mais faz sentido. Percebemos que é por esses momentos que procuramos, quando encontramos na nossa busca, na nossa odisséia terrestre o que nos preenche a lacuna latente a que os gregos atribuíam à cisão as almas.
O sentimento de completude se dá no encontro quando percebemos que nosso eco é respondido além da pergunta, mas com uma resposta que o preencha. É assim que percebo que os encontros vão além do olhar e do sentir.