sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Creedence Clearwater Revival X Kiss

Era inicio dos anos 80. Mais precisamente 82. Eu era um meninote de nove anos. Querendo mais do que tudo na vida, crescer e me tornar homem feito. Penso que nos divertíamos mais nessa época. Sexta-feira era dia de bola na rua até tarde. Sábado de manhã tinha bicicleta e mais futebol. E domingo, pra variar a pelada da rua de cima contra a rua debaixo. De vez em quando aparecia o primo mais velho de um dos amigos da turma para desequilibrar a partida. Por vezes ganhávamos. Mas a maioria das vezes voltávamos cabisbaixos com a bola embaixo dos braços. Os joelhos devidamente ralados as camisas bem sujas e suadas. Os rostos cansados eram um prenúncio de mais uma segunda-feira de aula bem cedo. Fazia disso tudo e muito mais com meus amigos de infância. Mas me lembro hoje de umas precocidades bastante interessantes. Aqui em casa sempre se ouviu muita música, e de qualidade. Minha mãe adora Beethoven. Acho que meu pai gostava mais de Chopin. Apesar de encontrar alguns LP’s com Carlos Gomes, Vivaldi e Tchaikovsky por aqui. Assim meu gosto pessoal pela música foi se formando, mas como um bom pré-adolescente-rebelde-sem-causa achei o rock, que ainda nesses tempos, era sinônimo de rebeldia. Rebeldia contra os pais, contra o país, contra o sistema – como se eu soubesse o que era o sistema. Contra qualquer coisa que parecesse arrumadinha demais. Havia nisso certo ar de contraposição à ordem estatutária. E tudo que fosse mais mal acabado de que bem, era melhor. Então, rock na veia do garoto. Comecei a ouvir os mais pesados da época. O rock brasileiro nascia, mas para mim algo que era oriundo da nossa terra era contaminado com algo que me incomodava. Ou era a tropicalidade, ou a teoria antropofágica (também não sabia disso na época). Assim, o melhor era mesmo o importado, o enlatado. Tudo que vinha de fora era melhor. Afinal vi que passamos anos trancados aqui dentro sem dialogar com o mundo, nada mais natural do que negar o recente passado e se aproximar do presente. Assim foi na minha formação do gosto musical. Numa dessas tarde rebeldes de sábado chuvoso, estava em casa, ouvindo no mais alto volume meu incansável LP do Kiss. Minha mãe chegou. Naqueles tempos, não sei como ela possuía mais paciência com o adolescente rebelde do que hoje, e me inquiriu categoricamente: - que barulheira é essa que você tá ouvindo meu filho? Eu quase aos berros respondi com desdenho o nome da banda ao mesmo tempo em que levantava a capa do LP que me acompanhava no chão da sala do pequeno apartamento e mostrava a ela. Ela me retruca dizendo que a guitarra era muito barulhenta e que aquilo não era música. Eu pensei, ai meu saco! Lá vem ela com as músicas clássicas no meu ouvido. Ela me chama e me diz incisivamente: deixa eu te mostrar o que é uma guitarra bem tocada. Tirou meu LP do toca-discos veementemente e colocou pra rodar um disco do Creedence. Ela me apresentava a primeira mulher da minha vida. Susie Q. Fiquei mudo, em silêncio. Peguei a capa do LP, abaixei um pouco o som, sentei-me mais próximo à grande caixa de som e comecei a prestar atenção em cada nota, cada solo, cada som da rouca voz de John Forgety. Foi mais que uma banda nova que minha mãe me aplicava, era um elo entre gerações que havia se construído. Enfim, descobrimos algo muito em comum que era próprio de cada um daqueles dois seres humano. E posso dizer que naquele dia aprendi muito mais do que ouvir.

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